O bairro de Jaraguá foi onde uma loira menina nasceu e passou parte de sua infância. Lembranças remotas da guerra, do escuro da noite, a presença de soldados do “velho” 4º RAM. Seu pai, jovem alfaiate, fazia consertos nas fardas dos militares e deles ouvia histórias interessantes.
O mar da Avenida, ainda não poluído, servia de lazer para três crianças, que precisavam cansar para que os pais fossem ao cinema já com os filhos dormindo.
Na Escola de Da. Mariinha, onde aprendeu a ler e escrever, via os meninos encherem a cabeleira de brilhantina para que a mão da professora escorregasse ao puxar-lhes o cabelo, por terem errado a tabuada.
Em 1949, maio, aconteceu um sério desastre na “Entrada do Poço”: choveu tanto que barreiras caíram e morreram várias pessoas. As famílias que residiam naquela rua, fugiram pela madrugada, deixando os destroços para trás. Lembrança triste de uma infância feliz.
Para alegria da garota, seu pai construiu uma casa na Avenida Fernandes Lima, no Farol; nova fase recomeçou para a família, onde já havia cinco filhos e outro devidamente encomendado. Anos felizes num bairro arborizado, cheio de boas casas, bons amigos, onde ainda passava o bonde, sumido em 1952.
Deus sabe o que faz e proporcionou ao jovem alfaiate, já transformado em servidor público, através concurso, criar seus filhos com algumas regalias: boa morada, colégios públicos de excelente qualidade, boas distrações, numa cidade calma.
Em agosto de 1954, descendo do ônibus, na antiga Rua da Alegria, a jovem de treze anos, orgulhosa aluna do Instituto de Educação, ouvia os gritos de pessoas: “Morreu Getúlio Vargas! Não vai haver aula!” Segurando uma bola de vôlei no braço, precisou voltar para casa e ouvir as notícias no rádio.
A família foi crescendo e, em 1962, já eram oito irmãos, os mais novos podendo estudar em colégio particular, devido ao início da decadência do ensino público.
A jovem loira casou com um militar e teve quatro filhos. Moraram em outros Estados, conheceram muitos amigos e puderam criar bem os filhos, apesar das várias mudanças. Numa época em que poucas mulheres trabalhavam fora de casa, a servidora do Poder Legislativo de Alagoas foi cedida a vários órgãos municipais, estaduais e federais, onde quer que residisse.
Voltou para Alagoas em 1985 e despertou para o sindicalismo. Tempo de ouro na vida da mulher, esposa e mãe.
As lutas foram crescendo, dando origem a enfrentamento com homens poderosos. Processos na Justiça foram aparecendo, ameaças graves. Os políticos não estavam acostumados com servidores reivindicando seus direitos. Frases do tipo: “Pode me chamar de senhor! Eu sou Deputado!” Ou então: “Ganhou novo direito na Justiça? Vou retirar o antigo!”
Na Justiça alagoana, a sindicalista conviveu com Juízes, Promotores, probos e justos. Mas também, ainda hoje se depara com magistrados que protegem os poderosos. Ela parte do princípio de que todos são humanos.
A velha senhora chegou aos oitenta e um anos! Perdeu, ganhou, sofreu, sorriu, chorou e, finalmente, amadureceu. Entendeu que existem vitórias e derrotas. Enxergou uma luz no fundo do túnel quando viu políticos famosos e sabidos respeitarem os servidores públicos.
Fica feliz quando ouve alguém dizer: “Você é Alari Romariz? Leio seus artigos e acompanho sua luta”. Não foi preciso ser deputada, senadora, juíza, advogada, médica, para ser reconhecida. Bastou interessar-se por causas nobres.
Deus existe. Não duvidem!
Alari Romariz Torres
É aposentada da Assembleia Legislativa
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